domingo, 22 de setembro de 2013

Naturellement



E tudo se deu naturalmente. Eu nem ia morar com vocês, a princípio seriam duas francesas. E tudo mudou num segundo e vocês me apareceram. Esses encontros da vida me fazem acreditar quase cegamente em destino. Parece impossível que não exista uma força bem poderosa, capaz de ter trazido vocês dois pra perto de mim e eu pra perto de vocês. Há um ímã inevitável, inegável. Nada mais explica encontros tão mágicos, era pra ser.

Depois de uns dez dias morando juntos, hoje foi o nosso momento. Obrigada pelas risadas e por terem se aberto tanto para mim e para os meus amigos. Obrigada pela atmosfera. Foi demais falar a mesma língua que vocês realmente, acho que eu nunca tinha feito isso tão bem sem ser na minha língua materna.

- C'était un bon début, je pense qu'on aura une bonne coloc
- Bah oui, je suis sûre

sábado, 21 de setembro de 2013

Carta para o meu pai




Na última noite, sonhei com você e acho que não foi à toa. Não que este tenha sido o único sonho que eu tive com você nesses últimos meses (tive alguns com o Bê também), mas dessa vez o meu sonho veio como força de impulso para que eu te escrevesse.

Não sei direito o que tem acontecido ultimamente e, me perdendo pelas minhas análises de tudo, acho que você muito menos. Mas, como tudo na vida, é perigoso a gente deixar coisas que pinicam a gente na nossa vida durarem por tempo demais, pois parece que fica cada vez mais difícil reverter a situação que ás vezes a gente nem sabe como começou. Na dúvida, melhor fazermos aquilo que nos cabe. Na dúvida, melhor dizermos o que sentimos.

Não por acaso, sonhei um sonho muito tranquilizante e perturbador ao mesmo tempo. No meu sonho, eu não tinha escrito esse e-mail e, por motivos que não haviam sido explicados, eu e você havíamos ficado muitos anos distantes. Muita coisa aconteceu, eu havia mudado de profissão, de cidade (pelo que tudo indicava, eu morava em São Paulo) e me casado. Você tinha conseguido abrir o seu negócio, o Bê tava enorme e vocês tinham um cachorro labrador. Parece que por muitos anos nós havíamos nos mantido distantes, sempre sabendo por alto e por terceiros notícias sobre o outro. Até que, lá pelos meus 40 e poucos anos, começamos a nos reaproximar com uns empurrãozinhos do Bê, que já estava com os seus vinte e poucos anos. Decidi, então, organizar e comprar uma viagem pra nós dois. Não foi nada muito sofisticado não, era um lugar tranquilo de praia no Brasil, mas foi a escolha ideal. Não sei exatamente que praia e que cidade, mas possivelmente na Região dos Lagos. Tirei, então, 1 semana do trabalho e do marido e te roubei por essa mesma semana dos seus tantos afazeres. Você tinha ficado surpreso, mas topou.

E, nessa semana, tivemos algumas boas conversas, demos outras boas risadas, comemos bolo de cenoura e ficamos os 2 lendo, um em cada rede diferente entre as tantas que estavam presas nas árvores que ficavam de frente pra praia. Cada um, um livro diferente. Separados, cada um ocupado com a sua própria leitura e mais conectados do que nunca, finalmente.

A questão é que a gente nem lembrava por que motivo não havíamos feito isso mais vezes. Não era por falta de vontade, por nenhuma das partes. Conversamos e fizemos o outro entender os nossos diferentes pontos de vista, que, a esse ponto, já datavam de um par de longuíssimas dezenas de anos.

Fica difícil explicar com palavras tudo que o sonho me disse. As cores dele eram lindas, muito vivas. E muita coisa não tinha mudado nada, apesar dos trajes já tão diferentes com os quais as nossas vidas se vestiam.

O que realmente importa é que ele me fez vir aqui pelo medo de ele se tornar realidade. Ao mesmo tempo que ele foi um sonho bom, agradabilíssimo, e que me deu vontade de fazer uma viagem dessas com você um dia - de preferência, não só uma vez -, ele foi muito perturbador porque me mostrou que por inseguranças, por pensar demais, por mágoas pequenas que vamos transformando em buracos enormes ou simplesmente por simples falta de cuidado, daqui a pouco a gente se afasta muito mais do que planejamos ou queremos de pessoas importantes pra nós.

Pois ele veio em tempo. Amanhã é seu aniversário e eu queria muito estar com você, levando um bolinho, um presente qualquer, indo no posto comprar a coca pro almoço ou apenas ajudando a colocar a mesa. Queria estar com você pra te dar um abraço gostoso, pra ver pela milésima vez os seus olhos enchendo d'água por estar com a família reunida (uma das coisas que não cansa nunca em você) ou pra ouvir as suas piadas bobas, já contadas centenas de vezes também. Queria estar com você pra acompanhar de perto os seus fios de cabelo de menos e sabedoria de mais - sem esquecer de cada marquinha que aparece no seu rosto e nas suas mãos e que só te deixam mais bonito.

Sinto muito pela minha falta. Deve mesmo ser difícil demais ter filhos e deixá-los ir pra longe da gente -  quem sabe daqui a 20 anos eu entenderei tudo isso melhor, do outro lado da mesa.

Eu espero que você esteja bem e quero que você saiba que eu não digo isso da boca pra fora ou porque estamos oficialmente no seu mês (dia dos pais e aniversário). Eu espero isso não só porque é agosto, mas porque não há um só dia em que eu não pense em você (aqui ou no Brasil, isso é o de menos).

Obrigada por ter me ajudado a me tornar a pessoa que eu sou.

Sinto saudades demais.

Amo você.

Um beijo grande.

encore une fois

através dos seus olhos,
que me abrem um horizonte novo
a cada encontro,
eu me redescubro

e aí você me traz um espelho
e me mostra mais um pedacinho de mim,
antes desconhecido

e eu transbordo de amor
encore une fois

porque você me percebe
e porque em você eu tenho alguém,
somos juntos
e o nosso entrelaçado é de alma

Manso

Para Rodri, meu querido amigo



Ei, obrigada pela oportunidade de te conhecer tão bem e tão facilmente. Com palavras de menos e sensações de mais. Obrigada pelo conforto em forma de calor humano, sem precisarmos emitir som algum. Obrigada por ser tão prático e apaixonante. Obrigada pelo riso solto, pelas sacadas geniais e pelo amor que transborda sem sufoco. Obrigada também por ter oferecido o sofá tantas vezes e por ter levado pra mim o edredom quentinho em cada uma delas e me coberto. Obrigada pelas piadas e pelas promessas. Obrigada por ter sentido, desde o princípio, reciprocamente, que nós iríamos marcar um a vida do outro. Obrigada por me ter dito isso e por ter sido você desde o primeiro minuto; por favor, nunca deixe de o ser.

Eu estou agora mesmo reparando nos nossos dedos entrelaçados. Eu mexo o polegar, acaricio o seu. Reparo nas cores, na textura, nos singelos movimentos. Olho fixamente. Sua mão abraça os meus dedos com um carinho só seu. E me sobe um impulso de te abraçar, mas eu fico no dedo.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Tatuagem

Seus olhos evitaram os meus
(já é o nosso habitual),
mas o seu corpo me aceitou bem
e respondeu com amor
Em cada pequeno gesto,
um pouco do que ficou

Seu gosto já não é mais o mesmo,
ficou claro que muita coisa mudou
Mas por baixo do toque,
da barba e cabelos;
por trás desse nosso olhar fugitivo
e de todas aquelas palavras não ditas,
ainda tem você
e ainda tem eu

Não encontramos nenhum nós,
parece que ele se perdeu,
evaporou
Já até duvidamos se um dia ele realmente existiu...
Será mesmo?
Mas eu avisto claramente
com aquela nitidez mil
um pouco do que poderia ter sido
e não foi

Nessa fragilidade da vida
onde tudo se esparrama pelo chão
num piscar
e as possibilidades vão escorrendo pelos dedos
ainda que fechemos as mãos com força
elas vão encontrando as brechas;
os átomos se dividem,
se adaptam,
e passam, viajam, deslizam
e o que era não é mais;
e o que podia ser, idém
já não pode mais

Mas sempre fica no ar,
naquela risada conhecida
com som de lar
Fica na barba embarassada
que arranhou outrora a minha pele
- sensível que só ela, mas que adorava ficar marcada de você
Fica nos gestos confusos por insegurança e desejo
quase encabulados, mas intensos como nunca
Fica nos nossos olhares fugitivos
que só confirmam
que, realmente,
muita coisa ficou
Cravada, tatuada,
entre você e eu


sábado, 14 de setembro de 2013

lábios

cê chega por trás de mansinho
afasta o meu cabelo e me beija a nuca
eu acordo, mantendo os olhos fechados
mas denuncio o despertar pelo arrepio imediato

você passeia o seu dedo indicador pela minha nuca,
desce pelas costas,
volta pros cabelos
e termina sentindo a minha boca

depois vem e sente tudo com os lábios
enquanto eu mordo os meus
ainda de olhos fechados,
mas te enxergando como nunca